Ama-me, de Hilda Hilst
Aos
amantes é lícito a voz desvanecida.
Quando
acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido:
Ama-me.
Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora,
Recolhe
tuas papoulas, teus narcisos. Não vês
Que
sobre o muro dos mortos a garganta do mundo
Ronda
escurecida?
Não é
tempo, senhora. Ave, moinho e vento
Num
vórtice de sombra. Podes cantar de amor
Quando
tudo anoitece? Antes lamenta
Essa teia de seda que a garganta tece.
...
Ama-me.
Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito
Vertigens
e pedidos. E é tão grande a minha fome
Tão
intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido
Que o
mundo inteiro, amor, há de cantar comigo.